
Vereadores em debate com secretária de Políticas Sociais em Pouso Alegre. Imagem reprodução CMPA
A filha do homem em situação de rua que apareceu sem roupas dentro do canil do albergue municipal de Pouso Alegre falou com o Terra do Mandu. Ela prefere não ser identificada devido a tudo que vem sofrendo após a repercussão do caso.
Em resumo, a filha explica que teve que retificar o primeiro boletim de ocorrência feito na Polícia Militar porque o objetivo dela é que a pessoa que colocou o pai no canil daquela forma seja responsabilizada.
A moça também deixa claro que não foi induzida a dar qualquer versão nos boletins de ocorrência e que não quer ser usada ‘como bode expiatório na política. Deixem de me colocar como um jogo; como se eu estivesse no meio de uma briga.
A filha também explica que o pai a abandonou quando ela tinha 3 anos, mas sempre o amou e já tentou, várias vezes, ter ele na casa dela. Ele até esteve morando na casa dela por dois anos, após ser atropelado em Pouso Alegre e enquanto se recuperava de uma cirurgia. Mas, ele preferiu deixa o lar e voltar a rua.
Foto divulgada pelo vereador Leandro Morais mostra o homem pedado no canil do Albergue Municipal / Foto: Divulgação Câmara
Pai da mulher foi agredido horas depois de denúncia na Câmara, por outro morador de rua na Avenida Vicente Simões / Foto: Reprodução CIDS
Acompanhe o depoimento da filha na íntegra
Abaixo você confere o áudio da mulher na íntegra (o mesmo que está em vídeo acima na matéria), onde ela enviou o relato ao Terra do Mandu na manhã desta sexta-feira (2/5). Confira:
“Na quarta-feira eu fui até Pouso Alegre, com o intuito de ver o meu pai, porque além da denúncia que eu havia tomado conhecimento da reunião ordinária onde foi realizada a denúncia, eu fiquei bastante assustada e fui até Pouso Alegre para que eu pudesse ver o meu pai e ver qual era o estado físico dele naquele momento. E poder fazer o meu papel de filha, que é estar do lado dele. Só que quando eu cheguei na cidade ele não estava no hospital mais.
Aí eu encontrei com o pessoal do CAPs, que faz visitas semanais no hospital e então eu fui junto com elas para o CAPs, tentar encontrar com ele e acabei que infelizmente as meninas não tinham como me ajudar a encontrar eles, porque eles não tinham contato com ele, como localizá-lo naquele momento. E aí fui conversar sobre assuntos familiares, apontar nossa história, para poder eles inserirem até no cadastro deles lá, porque eu estava lá e é o contato que a gente teve, a oportunidade que a gente teve de fazer isso. E aí depois chegou a Marcela (Secretária de Políticas Sociais – Marcela Nascimento) e mais três pessoas.
E aí a Marcela disse para mim que estava com o meu pai, que iria me levar até ele. Aí a gente começou a conversar sobre como estava o meu pai, a perspectiva dela. E aí depois que a gente conversou, eu iria já fazer um boletim de ocorrência e a gente foi até o batalhão, que ela também faria, ela quis me acompanhar nesse momento.
E a gente foi. E durante, quando o policial ia redigindo o texto do boletim de ocorrência, eu falava com ele, ele me perguntou onde eu tinha visto. Por isso que está escrito lá que eu vi no portal PousoAlegre.net, por isso está escrito que eu vi, que o Leandro publicou, porque foi onde eu vi. Isso é um fato, é inegável. E aí, conforme eu ia falando também, eles iam dando a perspectiva deles, juntos. Eles falavam algumas coisas em relação à perspectiva deles.
Eu deixei claro, tanto para a Marcela, quanto para as pessoas que estavam com ela, quanto para o policial, que eu não tinha lado político. Porque eu estava ali com o interesse de resolver e saber quem foi, quando foi, que fizeram aquilo com o meu pai. Porque se, por um segundo, as pessoas que estão raivosas e descendo discursos de ódio contra mim na internet parassem para pensar, o que é mais importante? É eu saber quem fez aquilo com o meu pai ou saber quem publicou a imagem? Porque saber quem publicou a imagem já é óbvio, foi o Leandro.
Isso é um fato também, é inegável. Foi ele que publicou primeiro, tanto que se ele não tivesse publicado, eu não teria visto. Então, eu não estava com o intuito de processá-lo ou fazer algo do tipo. Eu nem abri boletim de ocorrência contra ele. O meu intuito era esse. Era de saber o paradeiro do meu pai, saber quem fez as maldades com ele.
Era isso. Então, eu peguei e depois de ter feito o boletim de ocorrência, eu não estava muito bem. Porque a minha pressão estava subindo por conta de todo o estresse que eu passei. Porque se, por um minuto, alguém parar e pensar em ver o seu pai dentro de um canil, sem roupa, ficar sabendo que ele foi molhado e bateram nele durante toda a noite e ainda assim, no momento da denúncia, ele ter sido espancado, pisado no rosto dele, pisado nos órgãos genitais dele, eu acho que qualquer pessoa não ficaria no seu estado sã de consciência, não. Eu estava com a minha pressão alta, eu estava, eu tinha tomado remédio, eu não estava muito bem. Então, eu estava passando mal.
Ainda mais que foi no finalzinho ali, quando foi terminando, não vi a hora de eu ir embora. E quando eu cheguei em casa, eu não vi, eu nem prestei atenção quando o policial leu o boletim de ocorrência, porque eu não estava bem. Entendeu? E aí, eu peguei e no outro dia, fui ler o boletim de ocorrência. E vi que o final não condizia com a minha vontade. Que eu não quero saber quem fez a imagem, isso pra mim é inútil. Isso pra mim não tem serventia nenhuma.
Eu saber quem fez a imagem, eu já sei quem fez a imagem. Eu quero saber quem fez aquilo com o meu pai, quando foi. Quero que essa pessoa seja indiciada. Entendeu? Essa é a minha vontade, essa sempre foi a minha vontade. E aí, esse foi o motivo que eu fui retificar o boletim de ocorrência. Porque o final, a frase final, que determinava qual era a minha vontade, não condizia de fato com o que eu queria.
Aí eu fui, pedi, fui três vezes no batalhão onde eu fiz o boletim de ocorrência. Não encontrei o pessoal, acredito que por conta do feriado. Depois eu chamei a viatura para que eu pudesse fazer a retificação desse boletim. E aí sim, eu fiz a retificação. Mas eu quero deixar claro. Ninguém me induziu a nada.
Eu não tive uma indução, porque eles não me obrigaram a falar. Eles não me obrigaram a falar. Olha, eu estou confundindo, eles não me obrigaram. Eles apenas, no momento que eu estava lá, eles complementaram com a perspectiva deles. E se isso interferiu no momento em que o policial redigia o boletim de ocorrência, é outra coisa. Mas eles não me obrigaram a falar nada.
E é importantíssimo. É algo que eu quero destacar. Mais que qualquer coisa. A gente tem que perceber que, como eu disse várias vezes para todas as pessoas que eu encontrei e conversei. Esse é um problema público. Esse não é um problema da marida, meu. É um problema do meu pai. É um problema público. Acontece comigo, acontece com o meu pai, acontece com várias famílias do Brasil.
Inclusive de Pouso Alegre. Esse é um problema público. E tanto o Leandro quanto a Marcela, eles são um poder público. Eu preciso dos dois. Eu preciso da Marcela que cuida do meu pai. Que é responsável pelo albergue. Eu preciso do Leandro que fez a denúncia para não deixar isso como se não tivesse acontecido nada. Eu não estou do lado de nenhum dos dois. Eu falei isso para a Marcela. E ela concordou comigo. Eu falei isso para o Leandro. E o Leandro concordou comigo.
Eu estou sendo usada como um bode expiatório na política. A minha dor está sendo usada como isso. A dor do meu pai está sendo usada como isso. E as pessoas na internet estão fazendo discurso de ódio contra mim. Baseado nessas coisas. Eu não tenho lado político. Eu tenho lado que é o do meu pai. Independente do que as pessoas falaram de mim e possam haver falar, eu sempre vou estar do lado dele. Para vocês terem noção, ele foi embora quando eu tinha 3 anos de idade; 3 anos. Hoje eu já sou de maior. Eu já tenho família.
E em toda a minha vida, eu nunca virei as costas para o meu pai. Eu poderia. Porque eu não tenho compromisso com ele. Eu poderia virar as costas para ele dizer. Ele é meu genitor. Ele com 3 anos me abandonou. E a minha mãe trabalhava em 2, 3 serviços para poder me criar. Ela, minha avó e meus tios. Então eu poderia ter claramente isso. Mas não. Mas eu não fui ensinada assim. A minha mãe, por mais sofrimento que ela passou, ela falava para mim: “Você tem pai”.
Ela nunca me ensinou a odiar ele. Pelo contrário. Ela me ensinou a amar ele como ser humano. Como pessoa e como pai. E é por isso que hoje eu tenho um amor tão grande por ele. Por conta da minha mãe. Exclusivamente por conta dela. Porque ela nunca me fez odiar ele. E não é agora comentários, falácias sobre mim, que vai fazer isso mudar.
Eu ainda vou continuar buscando o que é melhor dentro das minhas possibilidades para ele. Hoje, infelizmente, eu não tenho como de acolhê-lo dentro da minha casa. Porque ele não vem. Ele já deixou claro para mim que ele não quer sair de Pouso Alegre. Ele já deixou claro para mim que ele não vai vir para a minha casa. Inclusive no passado, se eu não me engano, foi entre o ano de 2021, 2022, 2023, ele esteve comigo. Eu fui até Pouso Alegre, busquei ele. Ele esteve em uma clínica. Uma casa terapêutica aqui da minha cidade. Depois ele foi para Itajubá. Onde tinha uma condição um pouco melhor para poder atender. Quando ele sofreu o segundo acidente da perna.
Eu estive com ele em muitos outros momentos ruins. Eu estive como a única família dele nesses momentos. E eu sou a única filha dele. Então eu peço que as pessoas deixem de me colocar como bode expiatório na política. Deixem de me colocar como um jogo, como se eu estivesse no meio de uma briga. Porque eu não estou. Se eles querem brigar, discutir a opinião política deles, que façam isso no lugar devido, não na internet me colocando como um boneco, cada hora eu estou do lado. Porque não existe isso.
Eu quero ser colocado no lugar de respeito. No lugar de proteção. E não tem acontecido isso comigo. Inclusive tem envolvido a minha família, tem envolvido coisas muito além. Eu tenho recebido mensagens, recebido ligações, coisas me ameaçando. Por conta desse tipo de coisa. Eu não fui até aí para procurar esse tipo de coisa. Fui até aí para procurar a solução para o problema do meu pai. Então eu quero respeito.
Eu quero retificação. Inclusive o jornal que publicou a nota, dizendo que eu era paciente que tinha câncer, falou uma frase que eu nunca disse. Isso tudo é mentira. Isso tudo é mentira e também vai ser apurado. Porque é algo que me trouxe muitos prejuízos. Não só prejuízos psicológicos, mas prejuízos muito além, muito além que as pessoas não estão imaginando. Então eu peço por favor, retifiquem.
As pessoas que comentaram. Não precisa de tanto ódio. Eu sei que a internet é uma terra sem lei. Mas que vocês pensem primeiro. Busquem informações. Informações seguras. E aos jornais que publicaram falácias, tomem cuidado também. Porque todo jornal tem uma magnitude gigante. E isso não é desconhecido por ninguém não. E pode muito bem uma hora, uma vida ser perdida por conta disso.Entendeu? (11:18) Então eu agradeço a sua oportunidade de falar.
E peço que a minha imagem seja defendida a partir de agora. Não defendida, não precisa ninguém aclamar pelo meu nome. Mas que seja respeitada, essa é a palavra que eu quero. Que a minha imagem seja respeitada. Porque eu não quero sair batendo na porta de ninguém, não saio pedindo nada para ninguém. E não é questão de pedir não. Não saio prejudicando ninguém. Então eu não quero ser prejudicado. Pelo contrário. Eu fui para ajudar e estou sendo prejudicada”.
Polícia Civil abre investigação
A Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG) informou nesta sexta-feira (2/5) que instaurou Inquérito Policial para apurar as circunstâncias relacionadas à denúncia de maus-tratos a uma pessoa em situação de rua no município de Pouso Alegre.
“A PCMG está realizando as diligências e as oitivas para esclarecer os fatos. Em razão da natureza da investigação, o procedimento tramita sob sigilo. As informações pertinentes estão sendo devidamente apuradas, observando o rigor técnico e o compromisso institucional da PCMG, para a responsabilização de eventuais autores. Outras informações poderão ser divulgadas após a conclusão do procedimento investigativo”, disse a nota.