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Presídio de Pouso Alegre tem quase 450 detentos a mais que a capacidade

Projetado pra 418, local conta com 854 presos; em ofício, Diretor-Geral se pronuncia ponto a ponto sobre denúncias de familiares dos detentos

Iago Almeida / 10 fevereiro 2022

Foto: Terra do Mandu

No último dia 3 de janeiro, familiares de detentos realizaram uma manifestação em frente ao presídio de Pouso Alegre pedindo melhorias na visitação, saúde, alimentação e higiene dos detentos, além de realizarem denúncias de possíveis irregularidades dentro do local. Em ofício disponibilizado nesta semana e que o Terra do Mandu teve acesso, o Diretor-Geral do presídio, Nélio Gonçalves Teles, negou as irregularidades, comentou sobre as denúncias realizadas pelos familiares e falou sobre a superlotação do local. 

“É previsível que determinadas situações e medidas adotadas, ainda que legítimas e dentro das balizas legais e regulamentares, encontrem resistência da massa carcerária. É natural surgirem articulações visando desestabilizar o bom funcionamento da unidade e desacreditar a nova gestão por meio de infundadas denúncias”, comentou ele.

Segundo o diretor, o presídio foi projetado pra custodiar 418 indivíduos privados de liberdade e atualmente com 854, ou seja, encontrando-se superlotado. Além disso, ele citou ainda que há perspectivas de aumento ainda maior da sua população, uma vez que o presídio da cidade recebe detentos de outras comarcas do estado.

“Atualmente recebemos presos de 11 comarcas e 28 municípios, além de sermos a atual “porta de entrada” para as presas do sexo feminino em todo o Sul de Minas (em razão da interdição do Presídio Feminino de Santa Rita do Sapucaí) e também “porta de entrada” durante os plantões da polícia judiciária na região”, comentou ele.

Ele ainda destacou a recente troca de gestão na direção do presídio, uma vez que o Diretor-Geral anterior foi afastado de suas atribuições pelo próprio DEPEN/MG após denúncia de sérios indícios de irregularidades. Assim, ele citou que a permissão e tolerância a certas regalias foram revistas e canceladas.

“Por conseguinte, observa-se que em momento anterior havia um tratamento de certa forma mais afrouxado aos IPLs. Prova disso era a permissão e tolerância a certas regalias que extrapolavam regulamentações do DEPEN/MG, as quais na atual gestão foram revistas e canceladas. Como exemplo podemos citar a permissão de envio de chocolate pelos familiares dos detentos, como citado na própria denúncia em tela”, afirmou.

Foto: Terra do Mandu

Outra medida adotada e que pode ter interferido nas denúncias recebidas, segundo o diretor, é o aumento do controle e inibição de materiais ilícitos na unidade prisional.

“A maior frequência de procedimentos de segurança e apreensões de celulares e drogas dentro das celas pode ter desencadeado o descontentamento dos IPLs, que por meio de seus familiares, reclamam melhorias nas condições de cárcere e delatam abusos diversos”, comentou.

“Vale frisar que esta Unidade Penal conta com um circuito fechado de câmeras (CFTV) com monitoramento 24 horas por dia. Assim, caso seja detectada alguma irregularidade há possibilidade de averiguação pelas gravações que registram dia e hora do ocorrido”, completou o diretor.

O ofício foi enviado ao promotor Dr. Ricardo Tadeu Linardi, representante do Ministério Público da 9ª Promotoria de Justiça de Pouso Alegre. Nele, o diretor ainda se pronunciou sobre cada uma das reclamações e denúncias feitas pelos familiares dos detentos na última semana, como visitação, sedex, saúde, efetivação no trabalho das assistentes sociais, banho e local de acolhimento nos dias de visitação. Confira um a um abaixo:

Visitação

Em relação à visitação, os familiares apresentaram 4 demandas, sendo a primeira descrita nos seguintes termos: “Que volte às visitas de mais de um membro da família, incluindo filhos menores”.

De acordo com o diretor, pleito é razoável, mas ainda não encontra respaldo nos protocolos de controle e prevenção da pandemia do novo coronavírus (Covid-19), acentuada pela nova variante ômicron, de acordo com as resoluções do programa estadual Minas Consciente, as quais o Presídio de Pouso Alegre está vinculado.

Um segundo subtópico foi o retorno da visita íntima, que de fato estão suspensas, o diretor afirma que não é por causa qualquer tipo de punição ou sanção à população carcerária, mas pela falta de estrutura adequada para a sua efetivação.

“Em decorrência da alta rotatividade de detentos, o que inclui as do sexo feminino com toda sua logística especial de separação, condução e custódia, além ainda das questões sanitárias com a observância de quarentenas e isolamentos típicos de protocolos rígidos de contenção e controle da pandemia do COVID-19, a unidade prisional encontra-se com sérias dificuldades estruturais em retornar com as visitas íntimas”, comentou ele.

Em terceiro lugar, foi sugerido pelos familiares um aviso prévio sobre o turno em que a visita virtual entre detentos e familiares será realizada. Narra a denúncia que “O familiar fica o dia todo na espera, sem desgrudar do celular para não perder uma visita”.

De acordo com o diretor, “a sugestão é razoável, mas esbarra em eventuais problemas de ordem técnica e de procedimentos de segurança interna que podem ocasionar atrasos de diversas ordens. Nesse sentido, o agendamento de um horário específico para cada visita virtual se mostra inviável”, comentou.

O último subtópico da visitação foi a disponibilização de uma relação no início de cada mês com os dias e horários da visita presencial a fim de que o familiar possa se programar melhor.

“Diante dessa última demanda sobre a relação de dias e horários das visitações presenciais, informamos que há um grupo de WhatsApp em que as assistentes sociais da unidade informam os familiares acerca da programação de visitas, com a indicação dos dias e horários, justamente para que todos possam se organizar e efetivar a visitação”, encerrou o diretor.

Sedex

O item “sedex” foi dividido em 4 subtópicos pelos familiares, em que o primeiro solicita a ampliação da quantidade e qualidade dos itens, em especial na alimentação. Há a exemplificação do chocolate, que antes era permitido e agora não é mais.

“Em respeito à quantidade e qualidade de produtos permitidos na unidade prisional, informamos que obedecemos a normativas previstas no Regulamento e Normas de Procedimentos do Sistema Prisional de Minas Gerais – ReNP que, por questões de segurança e logística, limitam o envio de itens aos indivíduos privados de liberdade, como se vê pelo art. 527, que veda a entrada de alguns itens”, comentou Nélio Gonçalves.

Os itens que podem ser enviados, segundo a citação do diretor, são:

  • I – alimentos que contenham recheio e/ou cobertura;
  • II – alimentos com osso, espinho ou caroço;
  • III – alimentos como: salada de maionese; macarronese; estrogonofe e/ou salpicão com maionese; e similares.
  • IV – alimento com muito caldo ou gordura;
  • V – alimentos ácidos, como vinagrete ou similares;
  • VI – alimentos em pó, tais como: farinha; leite; achocolatado; e similares.
  • VII – bebidas com qualquer teor alcoólico;
  • VIII – suco embalado em caixinhas;
  • IX – iogurtes em geral;
  • X – doces com aspecto heterogêneo: como os que contenham pedaços ou camadas; e similares.
  • XI – frutas cítricas, abacaxi e uva;
  • XII – feijão com qualquer tipo de mistura:
  • XIII – quaisquer tipos de condimento e tempero;
  • XIV – uvas passas;
  • XV – azeitonas;
  • XVI – óleo ou azeite;
  • XVII – torresmo e bacon;
  • XVIII – queijo, exceto muçarela fatiada.
  • XIX – refrigerante de coloração escura; e
  • XX – embutidos: salsicha; linguiça; e similares.

Ainda falando sobre os itens, o diretor citou parágrafos do art. 527, além do art. 528 e 530, que trazem vedações quanto a entrada de itens na unidade prisional. Confira a lista do que é proibido:

  • § 1º Além dos alimentos elencados nos incisos deste artigo e desde que com o aval da Direção, serão retidos quaisquer outros que apresentem indícios de risco à saúde do preso e/ou à segurança da Unidade Prisional.
  • § 2º O total de alimentos limita-se ao consumo do dia e não poderá ultrapassar cinco quilogramas por preso, vedada sua estocagem nas celas.
  • § 3º As frutas cítricas e abacaxi poderão entrar, desde que estejam descascadas.
  • Art. 528. As bebidas serão limitadas, por preso, a:
  • I – 02 (dois) litros de refrigerante e/ou suco; e
  • II – 01 (um) litro de água mineral.
  • Parágrafo único. O quantitativo de bebidas deve ser considerado à parte do total de alimentos, sendo que as embalagens devem ser de plástico transparente, devidamente lacradas, devendo o conteúdo não estar congelado.
  • Art. 530. É proibida a entrada de talheres de metal e/ou vasilhames e/ou copos de vidro, os quais devem ser descartáveis.

“Ou seja, a entrada de alimentação na unidade prisional é limitada e controlada por regulamentos fundados na logística e segurança dos próprios detentos, familiares e servidores”, encerrou ele.

O segundo subtópico apresentado pelos familiares foi uma sugestão em que a família que tiver condições e disponibilidade tenha a opção de enviar itens via sedex semanalmente.

“Verifica-se que o pleito em questão não se justifica tendo em vista que os detentos já recebem adequada alimentação diária fornecida por empresa em contrato firmado com a Administração Pública representada pela Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública. Trata-se de empresa terceirizada com nutricionistas profissionais e cardápio amplo com uma dieta diversificada. Por contrato, a empresa possui padrões rigorosos de qualidade e também é fiscalizada rotineiramente pela subdiretoria administrativa deste Presídio”, comentou ele.

“Ademais, a família ainda é autorizada a enviar alimentação extra por meio do sedex dentro de limites pré estabelecidos. Ou seja, não há que se falar em alimentação insuficiente aos IPLs”, completou.

Além disso, os familiares pediram para que, para contornar os gastos com a postagem do sedex, houvesse a possibilidade de deixar os itens diretamente no presídio, sem passar pelo controle e distribuição dos correios. Entretanto, Nélio Gonçalves explicou não ser viável.

“Essa sugestão não se mostra viável tendo em vista que a unidade prisional não possui condições de proceder com todos os protocolos que os correios realizam, com o devido controle, pesagem e cadastramento de remetentes. Nesse sentido, o recebimento direto de itens enviados pelos familiares consumiria tempo, espaço e pessoal que a unidade não disponibiliza, sob pena de colocar em risco a própria segurança interna. Ademais, esse tipo de transação não contaria com uma padronização de embalagens como é feita pelos correios, fato que abriria margem para eventuais denúncias de extravio de produtos”, explicou.

“É importante mencionar que há regras estipuladas para o recebimento dos itens. Além do mais, esta Unidade entrega semanalmente cerca de 180 encomendas via Correios aos reeducandos. Entretanto, há circunstâncias em que nem todas as encomendas são entregues aos destinatários por diversos motivos fundamentados como, por exemplo, aqueles sedex que estão fora do padrão e/ou que contém itens não permitidos. Há ainda casos de reeducandos que foram sancionados com falta disciplinar de natureza grave aplicada pelo Conselho Disciplinar e também o envio de sedex por familiares sem o devido cadastro”, comentou.

Foto: Terra do Mandu

Saúde

Em relação à saúde, há dois subtópicos apresentados pelos familiares, sendo o primeiro a demanda por assistência à saúde 24 horas por dia e o segundo demanda atendimento psicológico aos IPLs. Segundo informado na denúncia, “muitos detentos reclamam que para chegarem a serem atendidos precisam “sacudir” a cela. E com isso os agentes castigam pela “bagunça”. Mas somente assim conseguem ser ouvidos”.

“A presente informação não procede e não há, no momento, nenhum detento em situação de sério risco de saúde custodiado nesta Unidade Prisional. Por oportuno informo que ocorreu a implementação nesta Unidade Prisional de um posto do PNAISP (Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema Prisional). O PNAISP atua junto ao setor de saúde prestando assistência básica de saúde, odontológica e psicológica aos custodiados”, disse o dirtetor.

Ele comentou ainda que a equipe técnica conta com a presença de médico e dentista em período integral três vezes por semana, além da presença diária de enfermeira e psicóloga que, somados aos profissionais que já atendem na Unidade Prisional, elevaram os números de atendimentos.

“Além disso, o PNAISP possibilita que os procedimentos de cadastro no sistema SUS, cartões de saúde, coleta de sangue, atualização de vacinação, realização de testes rápidos, eletrocardiograma, atendimento básico odontológico, dentre outros procedimentos que podem ser realizados dentro da própria Unidade Prisional, dando celeridade as demandas de saúde dos custodiados”, completou.

Efetivação no Trabalho das Assistentes Sociais

Em relação a esse item, foi descrito o seguinte pelos familiares na denúncia: “Que haja uma efetivação no trabalho das assistentes sociais em ajudar os presos e suas famílias, pois até que boa vontade elas têm em querer ajudar, porém esbarram muitas vezes nos seus superiores e na “cultura” do presídio. (frase dita por uma delas). A cultura do presídio não é reeducar e sim punir, é o que se percebe com as ações das pessoas que são pagas para além de manter a ordem, e que deveriam ter compaixão.”

O diretor explicou que a unidade possui apenas duas servidoras para o atendimento aos mais de 850 detentos, ou seja, a demanda é maior do que a capacidade, como se verifica em qualquer serviço público, segundo ele.

“Quanto ao presente tópico observamos uma generalização infundada na rotina de atendimentos realizada pelas assistentes sociais da unidade prisional. De fato a efetividade da prestação desse serviço fica aquém da expectativa dos IPLs e seus familiares. Entretanto, não se pode atribuir eventual responsabilização nas profissionais técnicas ou seus superiores”, citou Nélio Gonçalves.

Banho

No item “banho” foi levantado apenas uma demanda pelos familiares: “O preso tem apenas um horário para o banho, pois é fechado o cano que jorra água. Então que possa abrir mais vezes”. De acordo com o diretor, é ciente que a falta no fornecimento de quantidade mínima de água diária para suprir as necessidades fisiológicas dos IPL poderia gerar revoltas e crises internas de grande proporção, além de configurar possível violação à dignidade dos IPLs.

“Nesse contexto, a fim de garantir a continuidade do abastecimento de água na unidade prisional há de fato um racionamento controlado pelos policiais penais, por ordem desta Direção. O racionamento é necessário pois a experiência cotidiana mostra que caso a água permaneça corrente a todo momento há enorme desperdício acarretando graves crises internas de abastecimento”, afirmou ele.

Segundo Nélio Gonçalves, o controle é feito da seguinte forma: o registro é aberto 04 vezes ao dia, em média por 02 horas seguidas, tempo suficiente para que os IPLs realizem suas necessidades de higiene e asseamento pessoal e armazenamento de quantidade adequada em garrafas PET a fim de se hidratarem ao longo do dia.

O armazenamento de água em garrafas PET é previsto no próprio ReNP, que diz no parágrafo único do art. 609: “Somente nos casos de eventuais problemas no sistema de fornecimento de água à Unidade Prisional, os presos serão autorizados a manter, no interior de suas celas, reserva de água em garrafas plásticas e transparentes.

“A informação de que há apenas um horário para o banho dos recuperandos, portanto, não procede. Frisa-se, ainda, que caso seja constatado alguma dificuldade no abastecimento das caixas d’água da Unidade, logo são providenciadas medidas paliativas como racionamento e solicitação de caminhões pipas fornecidos pela COPASA”, completou.

Local de acolhimento nos dias de Visitação

Nesse item, foram apresentados 3 subtópicos, sendo o primeiro uma reclamação de que os familiares passam até 03 horas debaixo de “sol escaldante” e “num ambiente duro”, e, por fim uma sugestão para melhorias na espera dos familiares para a visita presencial, nos seguintes termos: “Se quisessem poderiam fazer uns bancos, um guarda sol para amenizar”.

Sobre o suposto atraso nas visitas, o qual ocasionaria uma suposta espera de 03 horas, o diretor informou que os procedimentos referentes a visitação dos familiares devem ser observados para a segurança de todos, conforme prevê o ReNP.

“Nossa unidade conta com o equipamento de raios x bodyscan em que todas as pessoas que adentram na Portaria 2 são submetidos, sejam visitantes, autoridades, advogados e servidores. Neste caso, em razão do número expressivo de visitantes que adentram na U.P nos finais de semana é natural que, em alguns dias, ocorra atrasos. Além disso, essa unidade possui um contingente muito baixo de Policiais Penais na proporção de números de reclusos o que torna as atividades rotineiras mais desgastantes e exigem mais cautela por parte das equipes de segurança”, comentou.

Identificação

Por fim, houve ainda a denúncia que os policiais penais algumas vezes não se identificam com o uso do soutache no uniforme, mencionando que há “relatos de parentes dizem que eles não usam”. Quanto a esse ponto, o diretor informou que os policiais penais têm o dever legal e regulamentar de serem identificados com seu nome no soutache devidamente afixado no uniforme, mas alguns momentos é necessário retirar a identificação.

“Ocorre que algumas vezes observa-se que há escoltas de emergência e urgência em que o policial se vê na necessidade de retirar o soutache para vestir o colete a prova de balas, afixando novamente o soutache no próprio colete. Nessa inda e vinda, é possível verificar a ausência temporária da identificação, mas reafirmamos, não é a regra”, explicou.


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