Polícia

Empresa é condenada a pagar R$ 1 milhão por cargas com excesso de peso na Fernão Dias

Fabricante de celulose recebeu mais de 1.600 autuações em 5 anos por transporte irregular de carga no trecho de São Sebastião da Bela Vista

Iago Almeida / 08 fevereiro 2022

Foto: Rede HG

Uma das maiores produtoras e exportadoras de papel do país, a empresa Klabin S.A foi condenada pelo Ministério Público Federal (MPF) por realizar transporte de carga com excesso de peso na Rodovia Fernão Dias, no Sul de Minas. Segundo a decisão, a empresa terá que pagar R$1 milhão a título de indenização por danos morais causados à coletividade.

De acordo com o MPF, no período de cinco anos, entre 2015 e 2020, a Klabin recebeu mais de 1.600 autuações por transporte de carga com excesso de peso, com repercussões no trecho da balança que passa pelo município de São Sebastião da Bela Vista.

A sentença afirma que foram 1.503 autuações pela Agência Nacional de Transporte Terrestre (ANTT), 12 autuações pelo extinto Departamento Nacional de Infraestrutura Terrestre (Dnit) e 97 multas aplicadas pela Polícia Rodoviária Federal (PRF), somando mais de 1.600 ocasiões em que seus caminhões foram flagrados transportando carga com peso acima do que é permitido pela legislação.

Para o Ministério Público Federal, tal conduta, além de evidente infração a normas de trânsito, potencialmente é causa de prejuízos materiais aos cofres públicos, já que reduz drasticamente a durabilidade do asfalto.

“Para se ter ideia do impacto sobre o pavimento das estradas, estudo do Dnit demonstrou que um acréscimo de apenas 20% no peso do veículo acaba duplicando o efeito da carga nas pistas. Além disso, a situação também coloca em risco os demais usuários das estradas, pois um peso maior do que o indicado piora as condições de trafegabilidade dos veículos, afetando vários de seus componentes, como eixos, suspensão, molas, freios e os próprios pneus, o que aumenta a probabilidade de acidentes, já que tais elementos não foram projetados para suportar os esforços adicionais gerados pelo excesso de peso”, afirma o MPF.

A ação ainda apontou que essa prática, adotada reiteradamente pela ré, como demonstram as inúmeras autuações, constitui violação à ordem econômica, pela concorrência desleal com empresários que respeitam a lei, já que o excesso de carga aumenta os lucros, na medida em que se transporta maior quantidade de mercadoria em menor número de viagens.

A reportagem entrou em contato com a empresa Klabin S.A que, por meio da Assessoria de Comunicação, afirmou que encaminharia uma resposta sobre o caso, entretanto, somente nesta quarta-feira (09/02). Assim que for enviada, postaremos aqui.

Recorde sul-americano

O Juízo Federal de Pouso Alegre concordou com as alegações do MPF e considerou que a Klabin violou não somente as normas de trânsito, no que é passível de repressão pelas autoridades administrativas no exercício do poder de polícia, como normas do Direito Civil que dizem respeito à coletividade, entre elas, o direito de todo cidadão a um trânsito seguro, para salvaguarda da sua vida e integridade física.

Citando precedente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a sentença lembrou que o Brasil é um dos recordistas de acidentes de trânsito em todo o mundo, apresentando altíssimo índice de mortes nas rodovias.

“Dados da Organização Mundial de Saúde colocam-nos como quarto País, nas Américas, em que mais se mata em acidentes de trânsito; e como campeão de mortes, em proporção ao número de habitantes, na América do Sul. (…) Estima-se que aproximadamente 43% dos acidentes nas estradas federais terminem com mortos ou feridos, totalizando um óbito para cada dez quilômetros de rodovia, e 234 para cada milhão de habitantes”, registra a decisão judicial, para concluir “ser inadmissível ao Poder Judiciário, defrontado com infrações cotidianas, repetitivas e por vezes confessadas contra o direito de todos, permanecer indiferente ou se omitir quando provocado a agir”.

Foto: ELEMONT ENGENHARIA

Conta e risco

O Juízo Federal analisou e rechaçou todas as inúmeras alegações feitas pela defesa, entre elas críticas à atuação dos órgãos fiscalizadores, questionamentos quanto ao procedimento adotado para a pesagem dos veículos, o fato de a maioria das suas autuações ter sido do tipo excesso de peso por eixo, e, até, a afirmativa de que a tara (peso do veículo sem carga) registrada na carroceria das carretas e caminhões não corresponde ao peso real, pois os transportadores fazem inúmeras alterações após adquiri-los.

Para o magistrado, qualquer “mudança nas características originais do veículo é feita por conta e risco do proprietário, já que a manutenção dos dados cadastrais do caminhão nos bancos do órgão de trânsito é medida de interesse público e as informações lá constantes devem corresponder ao que o veículo efetivamente apresenta”, afirma.

A sentença lembra que a fiscalização inclusive considera, na pesagem e estabelecimentos dos limites aceitáveis, margens de erro que servem para abranger inter-ocorrências e fatores exógenos, como frenagens, lombadas e vias esburacadas, que possam deslocar a carga e interferir, por exemplo, fazendo com que se acumule peso em um dos eixos.

“Esta argumentação, entretanto, não deve servir para afastar a responsabilidade do transportador, quando flagrado com excesso de carga, já que se autuado com peso acima do permitido de forma discreta, sua conduta não será censurada. (…) A autuação não é matemática, mas leva em conta todas as circunstâncias levantadas pela requerida que podem alterar o peso dos caminhões. Uma carga flagrada com peso acima do permitido, com a consideração das margens legais, é, sem sombra de dúvida, uma carga com massa imprópria para transitar na rodovia”, completou o MPF.

Embargos

O Ministério Público Federal recorreu da sentença e solicitou que o juízo analise ainda o pedido de outra condenação para a empresa: a obrigação de ela não sair ou transitar com mercadorias e veículos de carga com excesso de peso de seu estabelecimento ou de empresas contratadas por ela. Neste caso, a pena pode gerar mais multas, de R$ 20 mil por veículo. Clique aqui para ler a sentença completa.

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