Professora ultramaratonista começou a correr aos 36 anos

Magson Gomes / 15 julho 2018

A mais recente prova foi de 235 km, nas montanhas da Mantiqueira. A professora diz que ama a sala de aula. Mas a corrida é mais prazerosa. “É uma terapia muito grande”.

Professora da rede pública, mãe de três filhos, dois biológicos e uma filha adotiva. Já foi casada, mas se separou. Essa é a Angela Ribeiro, de 49 anos, moradora de Pouso Alegre, Sul de Minas. Até aí, a vida dela se parece com a de outras tantas mulheres do Brasil. Mas, nossa personagem tem algo que a torna um pouco diferente, com força e resistência. Angela resolveu, aos 36 anos de idade, praticar o que sempre quis, mas não encontrava o incentivo e o apoio desejados. Ela decidiu que seria corredora. Não de qualquer corrida. Ela já partiu para se tornar uma ultramaratonista. Assim, surgia a professora ultramaratonista.

A mais recente corrida que a professora participou foi a ultramaratona UAI (Ultra dos Anjos Internacional), realizada no final de junho em Passa Quatro, na Serra da Mantiqueira, Sul de Minas. Foram 235 quilômetros, na categoria XHard. Como o nome já indica, com grau de dificuldade altíssimo, que exigia muita resistência do atleta. E Angela conseguiu. Ela completou a prova depois de 59 horas, chegando em 7º lugar, entre as mulheres que participaram da corrida.

“Foi excelente. Foi uma emoção muito grande ter cumprido a prova, porque senti muita dor no quadril. Eu imaginava que não daria para completar; e eu consegui completar a prova de 235 km”, conta ela ao recordar que a UAI é considerada a prova mais dura do Brasil. Não é a mais extensa, mas é difícil pelo percurso de montanha.

A professora quer continuar nas ultramaratonas de montanha (Foto: arquivo pessoal)

Essa foi a quarta ultramaratona que a professora correu, a terceira só neste ano de 2018. Ela ainda está com as dores da prova, mas já pensando na próxima aventura.

“Tem gente que fala assim: pronto Angela, já foi lá, matou a vontade, nunca mais neh? Mas eu gosto desse lance de superação de limites. Eu tenho um carinho e respeito demais as montanhas. A gente tem que saber lidar com o percurso. Para esse ano, quero correr a ultra de Marmelópolis, acho que é de 70 km”, se programa.

Como surgiu uma ultramaratonista

Como falamos a cima, Angela fez sua primeira corrida aos 36 anos. Primeira mesmo! Ela não treinava; nem caminhada fazia. E já partiu logo para uma prova de 10 quilômetros, realizada em Piranguinho, onde morava. “Não aconselho isso para ninguém. As pessoas têm que primeiro fazer exames para iniciar na prática do esporte. Eu iniciei do sedentarismo para a prova de 10 k”.

O atropelo de correr logo uma prova antes de se preparar justifica-se pelo desejo que estava guardado. Angela conta que sempre gostou da corrida como esporte. Assistia à corridas na TV, acompanha a modalidade, mas não praticava. “Eu não tinha o apoio, o incentivo. Eu me casei e o marido dizia ‘você está velha para isso’. E eu tinha 23 anos. Infelizmente, deixei isso me levando. Falava de me inscrever numa prova, e não me inscrevia. Até que um dia falei vou lá! E fui”.

Depois da prova de 10 km, a professora novamente pulou etapas e já partiu para uma maratona (42 km). “Já fui maratonista antes de correr uma meia maratona. Então eu faço meio do avesso”, confessa.

Ela queria mesmo é ter pulado dos 10 km para a ultramaratona BR 135, uma da mais tradicionais, com largada em São João da Boa Vista e chegada em Paraisópolis. “Mas para você participar da BR 135 você precisa ter no currículo algumas maratonas, ultramaratonas, e eu não tinha nada disso. Então, não deu para eu fazer essa arte de pular de 10 k para uma ultramaratona. Eu pulei para maratona’.

Hoje, além das quatro ultramaratonas, Angela tem dezenas de outras provas Brasil afora. Ela já correu a São Silvestre, a Maratona e a Meia Maratona do Rio de Janeiro, a Volta da Pampulha e outras tantas. São 60 troféus espalhados pela estante e centenas de medalhas ainda sem um lugar fixo na casa.

De todas as provas, ela gosta mesmo é das ultramaratonas de montanha. A primeira foi a UD de Passa Quatro, com 80 quilômetros na Mantiqueira.

“Quando eu corri 10 quilômetros e não parei mais, correndo quase todos os dias, já comecei a sonhar com ultramaratona. Eu lia livros, como o de Dean Karnazes, [ultramaratonista americano, que já correu 563 km sem parar e fez 50 maratonas em 50 dias consecutivos]. Fui me apaixonando cada vez mais”.

Angela diz que enfrentar a sala de aula é mais difícil do que correr (Fotos: Arquivo pessoal)

Os treinos e a sala de aula

Hoje, a professora já trabalha melhor essa questão de treinos. Mas ainda enfrenta dificuldades por ter que conciliar a sala de aula com os exercícios. “Durante esses 13 anos, eu treinei com planilhas, com supervisão do professor Celinho [do atletismo da prefeitura]. Sou bem disciplinada para esse tipo de treino mais vigiado”, diz Angela que agora consegue focar na preparação para as ultramaratonas que participa.

Porém, os horários de treinos que não são tranquilos. Às vezes, é preciso treinar antes da 06h da manhã e à noite porque durante o dia tem que estar em sala de aula.

O que diz os filhos e a superação da depressão

Os filhos de Angela já são adultos. Ela conta que eles ficam de longe, torcendo. Acham que é um pouco ‘doideira’ dela, mas apoiam. “Eles acompanharam minha história de vida. Tive momentos que entrei em depressão. Hoje quando eles me vêem assim, sabem que a mãe está viva, a mãe está bem”, se emociona.

Na corrida, Angela encontra equilíbrio emocional (Foto: Arquivo pessoal)

O amor pela corrida

A professora diz que ama a sala de aula. Mas a corrida é mais prazerosa. Ela começou a correr não foi correr para emagrecer, nem por uma questão direta de saúde. Foi porque gostava do esporte. Hoje sente que a corrida lhe faz muito bem para o equilíbrio emocional. “É uma terapia muito grande. Sinto muito bem emocionalmente quando estou treinando, quando eu corro, quando tenho uma prova para fazer. Conseguir completar uma prova como essa para mim, é pessoal, eu consegui, eu posso. Então, esse lado é bastante importante. Ele me motiva para ser cada melhor, não na corrida, mas como pessoa. Então é muito legal”.


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