Rafael Simões tem direitos políticos suspensos na ação sobre desvios de materiais do HCSL

Tribunal Federal manteve condenação criminal, mas reduziu pena. Sentenças cabem recursos. Simões afirma que será candidato em 2026.

Magson Gomes / 04 outubro 2025



Deputado Rafael Simões que foi presidente da FUVS entre 2013 e 2016 e se mantém influente na instituição. Foto: Divulgação FUVS

A Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 6ª Região acatou recurso do Ministério Público Federal e condenou o deputado federal Rafael Simões (União) a perda dos direitos políticos por oito anos por ato de improbidade administrativa. A decisão do colegiado foi unânime.

A sentença de segunda instância saiu na última terça-feira (30/9), durante julgamentos das ações cível e criminal que analisam desvios de medicamentos e materiais hospitalares do Hospital das Clínicas Samuel Libânio (HCSL) “para fins particulares, especialmente no tratamento de gado bovino de propriedade de Rafael Simões”.

As irregularidades teriam ocorrido no período em que Simões foi presidente da Fundação de Ensino Superior do Vale do Sapucaí (FUVS), entre 2013 e 2016, instituição mantenedora do hospital, e uma em 2017, quando ele já estava prefeito de Pouso Alegre.

Na análise dos recursos da defesa do deputado e do MPF em relação à ação criminal, Rafael Simões teve a pena fixada em dois anos e oito meses de reclusão, reduzindo a pena aplicada na condenação dada pelo juízo da 2ª Vara Cível e Criminal da Justiça Federal em Pouso Alegre, em novembro de 2021, que tinha sido de 10 anos de reclusão.

O desembargador relator do processo no TRF6, Derivaldo de Figueiredo Bezerra substituiu a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos. Uma delas será a prestação pecuniária no valor de 10 (dez) salários mínimos, em espécie; a outra consiste em prestação de serviços à comunidade ou entidades públicas, pelo período da pena privativa de liberdade”.

As decisões do TRF6 cabem recursos das defesas dos réus e do Ministério Público Federal, autor da denúncia.

Os argumentos do relator do processo no TRF6 e veja o que diz Rafael Simões

O Terra do Mandu teve acesso aos documentos do julgamento ocorrido na 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 6ª Região, com sede em Belo Horizonte.

Em seu relatório e no voto proferido, o desembargador relator do processo no TRF6, Derivaldo de Figueiredo Bezerra, expõe seus argumentos para manter a condenação na ação penal e a sentença inédita de perda de suspensão política por ato de improbidade administrativa dos acusados.

A denúncia do Ministério Público Federal é de 2018, após sindicância interna realizada na FUVS demonstrar que, entre 2014 e 2017, houve o desvio de materiais de medicamentos do Hospital das Clínicas Samuel Libânio para serem usados no tratamento de animais na fazenda de Rafael Simões.

Conforme o MPF, a retirada dos materiais “ocorria mediante a criação de “contas-paciente” fictícias no sistema TASY, com inserção de dados falsos de atendimentos inexistentes, precificação dos itens a valores supostamente subsidiados (“tabela SUS”), abaixo dos praticados para particulares e, por vezes, até inferiores ao custo de aquisição, e por dispensação de medicamentos controlados (amicacina) sem prescrição médica”.

Ao todo, como demonstrado no processo, foram desviados do Hospital das Clínicas Samuel Libânio, 6.800 agulhas, 2.950 seringas, 180 ampolas de Amicacina, 181 frascos de solução ginger, 40 frascos de água destilada, 30 frascos de cloreto de sódio, 26 frascos de soro glicosado e 44 frascos de bicarbonato de sódio.

A defesa de Rafael Simões sempre alegou no processo e nas declarações do próprio deputado à imprensa e em suas redes sociais, de que não houve irregularidade na aquisição dos materiais e medicamentos. Que ele pagou pelo material, “dando lucro de 30% ao hospital”.

No recurso enviado ao TRF6 a defesa também alegou de que não seria de competência da Justiça Federal julgar as ações, considerando que o HCSL e a FUVS teria natureza jurídica privada.

O desembargador discordou dessa apelação. “Conforme bem delineado na sentença de primeiro grau, restou amplamente demonstrado nos autos que os materiais desviados eram oriundos de recursos federais repassados ao HCSL por meio do contrato n. 152/2014, e seus aditivos, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), totalizando repasses superiores a R$ 257 milhões entre os anos de 2014 e 2017. Ademais, o Tribunal de Contas da União instaurou a Tomada de Contas n. 012.647/2018-7, fato que denota o efetivo controle federal sobre os recursos aplicados”, aponta o desembargador Derivaldo Bezerra em seu voto.

“Dessa forma, a análise do acervo documental e testemunhal constante no procedimento administrativo demonstra a ocorrência de desvios de bens públicos pertencentes à instituição hospitalar, em proveito particular, mediante conduta articulada e dolosa dos envolvidos, o que confirma a materialidade do delito de peculato-desvio, tipificado no art. 312, segunda parte, do Código Penal, tal como descrito na exordial acusatória as internações fictícias no sistema TASY eram realizadas com o intuito de encobrir os desvios, simulando a realização de procedimentos médicos em pacientes humanos”.

O relator continua seu voto: “Desse modo, deve ser rejeitada a tese sustentada por Rafael Simões no sentido de que os registros efetuados no sistema TASY visavam conferir transparência às aquisições de medicamentos e materiais. As provas constantes nos autos demonstram que não havia nenhuma intenção de dar publicidade ou controle formal às retiradas, as quais eram solicitadas de maneira informal, seja por telefone ou por meio de comunicações não oficiais entre a Diretoria Executiva e os setores da farmácia, almoxarifado e tesouraria, revelando o propósito de encobrir os desvios, e não de torná-los transparentes”.

“De igual modo, não merece acolhimento a alegação de que os pagamentos efetuados por Rafael Tadeu Simões representariam intenção legítima de aquisição dos medicamentos e materiais retirados do hospital”.

“Verifica-se que tais pagamentos ocorreram muito tempo depois da efetiva retirada e utilização dos insumos pelo então presidente da FUVS, sendo realizados com significativo lapso temporal: seis meses após a dispensação no caso da conta-paciente n. 2.423.535 (Evento 222- VOL5, p. 1), e doze meses depois nos casos das contas-paciente n. 2.605.403 (Evento 222-VOL5, p.3) e n. 3.026.133 (Evento 222-VOL5, p. 9). Ademais, a quitação da conta-paciente n. 3.087.414 somente se deu após o ajuizamento da presente ação penal (ID 390104907)”.

“Na verdade, os elementos dos autos revelam que o hospital foi utilizado como fonte irregular de fornecimento de materiais destinados à fazenda particular do acusado, sendo os pagamentos realizados de forma extemporânea, apenas quando os fatos se tornaram objeto de apuração formal, com a evidente intenção de afastar suspeitas”.

“Ao contrário do que sustenta a defesa, as provas demonstram que houve ocultação deliberada da saída dos bens, em total ciência da vedação de vendas diretas pela instituição hospitalar, com cobrança de valores equivalentes ou inferiores ao custo”.

Assim, restou evidenciado o dolo na conduta do réu, que desviou os bens públicos do HCSL para atender exclusivamente seus interesses pessoais”, argumenta o juiz federal que deu a sentença pela condenação pelo crime de peculato-desvio, fixando a pena em dois anos e oito meses, explicado no início dessa matéria.

Ação administrativa

Sobre a acusação de improbidade administrativa, a defesa de Rafael Simões argumentou no processo “que os medicamentos e insumos do Hospital das Clínicas Samuel Libânio (HCSL) não foram desviados, mas sim legitimamente adquiridos por Rafael Tadeu Simões; que não houve dolo ou má-fé por parte dos réus, requisito essencial para a configuração da improbidade administrativa; e que as condutas, embora “não exemplares ou inadequadas”, não constituíram atos ímprobos que violassem os princípios da legalidade, impessoalidade ou moralidade”.

A sindicância inicial que baseou a ação do MPF é contestada pela defesa de Rafael Simões como sendo politicamente motivada e com depoimentos obtidos sob coação.

No entanto, o desembargador reformulou a decisão de primeira instância e condenou os acusados por ato de improbidade administrativa.

“Entendo que a utilização de materiais de Hospital, que constitui entidade beneficente e recebe verbas da União, para realizar exames de sangue de animais da fazenda do gestor, bem como para “tratá-los”, constitui, indiscutivelmente, ato de improbidade. E a gravidade é tamanha que se mostram irrelevantes os aspectos pecuniários do dano”.

“Relevante notar, desde logo, que os apelados não negam tais fatos, restringindo-se, a questão do recurso, à configuração ou não do ato de improbidade administrativa e às conseguintes sanções”.

Outras condenadas

Além de Rafael Simões, também foram condenadas nas ações penal e administrativa Silvia Regina Pereira da Silva e Renata Lúcia Guimarães, ex-funcionárias da FUVS que ocuparam cargos de chefia e seriam responsáveis por autorizar as retiradas. As duas receberam a mesma sentença que o deputado na ação penal e metade por ato de improbidade administrativa.

Rafael Simões na Câmara dos Deputados – Imagem – Reprodução Assessoria de Comunicação

Rafael Simões diz que será candidato em 2026 e que sofre perseguição

O deputado federal Rafael Simões afirmou, através da sua assessoria, que irá recorrer das sentenças proferidas na 1ª Turma do TRF6,

Simões também divulgou um vídeo onde afirma que será candidato a deputado federal em 2026 e que esse julgamento “trata-se de uma perseguição da esquerda”.

“Olá, amigos e amigas. É, estamos vivendo momentos difíceis no Brasil, estranhos. Enquanto pessoas ligadas diretamente à esquerda roubam mais de 100 bilhões dos nossos aposentados e pensionistas, eu sou condenado por ter comprado da farmácia do Samuel Libânio R$ 2 mil em materiais.

Comprado, tirado nota fiscal, pago com cheque meu e mais ainda, tendo dado lucro de 30% para a instituição, como reconhecido pela juíza em primeiro grau. Mas, tudo isso não passa de uma perseguição política que induz o judiciário a erro.

Mas, eu quero dizer àqueles que estão comemorando que é muito cedo para a conglomeração. Eu, com certeza, serei candidato a deputado federal em 2026 para continuar cuidando do povo. Aliás, o que me trouxe para a política foi exatamente isso, cuidar das pessoas.

Como cuidei de Pouso Alegre enquanto prefeito e como continuo cuidando das pessoas aqui como deputado federal. Quer na saúde, quer cuidando dos nossos agricultores, quer mandando recursos para as nossas instituições filantrópicas. E é isso que me move.

Ao contrário daqueles que estão lá em Pouso Alegre comemorando e que estavam na Câmara Municipal dizendo para não ter CPI do Natal, porque não se pode apurar que se alugou um Papai Noel por mais de R$ 100 mil, enquanto a compra do mesmo custaria R$ 9 mil.

Pessoas mais ligadas à esquerda acham que isso é normal, mas para mim não é. Eu vou continuar aqui intransigente em relação a esse tipo de ação. E de cabeça erguida, até porque tenho certeza absoluta de que não cometi nenhum ato ilícito que pudesse lesionar qualquer um, muito menos o Hospital Samuel Libânio.

Mas eu quero aqui pedir desculpa à minha família pela exposição e levê-los a querer. Vocês são muito importantes para mim, da mesma forma que vocês sabem da importância que tem o povo, principalmente as pessoas mais simples, e me conduz a ser político para cuidar delas.

Por isso, eu quero dizer a vocês, continue firme na política, trabalhando, e vamos mostrar, através do recurso, que tudo não passa numa perseguição agendada pela esquerda para tirar aqueles que não apoiam essa política do comunismo, essa política do socialismo”.

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