Pouso Alegre

Sindicância diz que Rafael Simões retirou, de maneira irregular, medicamentos de dentro do HCSL

Magson Gomes / 14 setembro 2018

Prefeito de Pouso Alegre, então presidente da FUVS, diz que pagou pelos produtos retirados do hospital. Atual direção da instituição e funcionários ouvidos pela sindicância interna afirmam que venda dos materiais e medicamentos era irregular. produtos só poderiam ser utilizados em pacientes, após prescrição médica.

A reportagem do Terra do Mandu teve acesso ao relatório da sindicância interna realizada pela Fundação de Ensino Superior do Vale do Sapucaí (FUVS) que apurou desvios de materiais e medicamentos de dentro do Hospital das Clínicas Samuel Libânio (HCSL), mantido pela fundação. Os supostos desvios foram em nome do prefeito Rafael Simões (PSDB) e feitos em contas de paciente fictício. Foram milhares de materiais e medicamentos levados por Simões de dentro do hospital. O prefeito nega que tenha feito algo de ilegal e que pagou pelos produtos. Porém, a FUVS garante que a venda não poderia ser feita porque são de uso exclusivo dentro do hospital. Os próprios funcionários envolvidos no esquema e ouvidos pela sindicância também afirmaram que a comercialização dos produtos não poderia acontecer, mas recebiam ordens superiores.

As supostas irregularidades apontadas pela sindicância ocorreram entre 2014 e 2017, ‘através de lançamentos fictícios em contas hospitalares’ em nome do prefeito Rafael Simões, presidente da FUVS na época. O relatório da sindicância a que a reportagem teve acesso traz os detalhes de como teriam ocorridos os supostos desvios. Tem ainda a quantidade de material retirada do hospital. E ainda, em depoimentos, funcionários dos setores de farmácia, compras e tesouraria do HCSL detalharam como recebiam ordens para disponibilizar os produtos para Simões.

No dia 30 de agosto, o portal Terra do Mandu noticiou que, após sindicância, cinco funcionários do HCSL foram demitidos por justa causa. Eles estariam envolvidos no esquema.

A justiça acatou o pedido do promotor Agnaldo Lucas Cotrim, Curador das Fundações, para suspender, temporariamente, as demissões dos cinco funcionários demitidos. O promotor alegou, em seu pedido, que as demissões podem trazer danos ao patrimônio da fundação, caso a Justiça do Trabalho reverta a justa causa. Ainda segundo a solicitação de Agnaldo Cotrim, não foi dada ampla defesa aos empregados demitidos.

Hospital não pode vender medicamentos para terceiros, segundo direção, apenas aplicar em pacientes após prescrição médica. (Foto: Terra do Mandu)

Como funcionou o esquema de desvios

Foram cinco protocolos de atendimentos fictícios em nome de Rafael Simões. Da entrada para o suposto atendimento médico, que nunca ocorreu, e à alta, eram poucos minutos. Têm protocolos de seis minutos, de nove e de 17 minutos. Porém, foram lançados na conta do paciente milhares de itens como agulhas, seringas e medicamentos. O relatório da comissão interna aponta que seria impossível alguém utilizar todo esse material no tempo de atendimento indicado na ficha.

No dia 25/07/2014, como informa o protocolo nº 2.423.535, Rafael Simões deu entrada no hospital às 10h10 e teve alta às 10h27. Nos 17 minutos, foram relacionadas 130 ampolas do antibiótico Amicacina, 51 frascos de solução ringer. E mais 400 agulhas, 500 seringas e 100 equipo macrogotas (material para tomar medicação na veia).

No dia 05/01/2015 novo protocolo de atendimento em nome de Rafael Simões é aberto. Ele entre às 14h36 e sai nove minutos depois, às 14h45. Na conta do paciente nº 2.605.403 foram mais 50 ampolas de Amicacina, 30 frascos de cloreto de sódio de 250 ml, 90 frascos de solução ringer e seis frascos de soro glicosado de 500 ml. Para esse atendimento, em materiais foram listadas 2.700 agulhas descartáveis, 50 equipo macrogotas e 950 seringas.

No dia 22/03/2016 Rafael Simões tem novo protocolo aberto em seu nome. Dessa vez o atendimento vai das 16h54 às 17h. Em seis minutos registraram na conta do paciente nº 3.087.414, 26 litros de água destilada, mais oito unidades de água destilada de 500 ml, 32 frascos de 250 ml de bicarbonato de sódio, quatro ampolas de cloridrato de Prometazina e 20 frascos de Soro Glicosado. De materiais foram 1.600 agulhas, 1.250 seringas e 60 equipo macrogotas.

No dia 26/01/2016, a conta paciente nº 3.026.133, informa que Rafael Simões deu entrada às 16h47 e saiu no dia seguinte, 27/01/2016 Às 09h52. Nesse atendimento teriam saído apenas materiais, sendo 400 agulhas e 250 seringas.

No dia 23/01/2017, novo protocolo de atendimento de Rafael Simões, agora já prefeito de Pouso Alegre e ex-presidente da FUVS. O horário de entrada é às 11h34 e alta às 11h37. Em três minutos forma listados 12 litros de água destilada estéril, 12 frascos de de 250 ml de bicarbonato de sódio e 40 unidades de solução ringer de 500 ml. De material foram 1.700 agulhas.

Em depoimentos, funcionários confirmam que atos eram ilegais

A comissão de sindicância nomeada pelo Conselho Diretor Interino da FUVS ouviu 12 pessoas para apurar as supostas irregularidades. Destes, 10 foram ouvidos como investigados porque atuavam diretamente nos setores por onde os desvios ocorreram.

Em depoimento, a farmacêutica Roseane Fraga disse que fez lançamentos de produtos na conta paciente, sem prescrição médica, porque recebeu ordens superiores e poderia sofrer represálias.

A diretora do hospital Jusselma de Paiva Reis, três farmacêuticas e a chefe de compras confirmaram em depoimento que não poderia haver venda dos produtos e que medicamentos e materiais só deveriam ser liberados via prescrição médica. O que nunca ocorreu nos casos envolvendo a supostas contas paciente de Simões.

Ainda de acordo com os depoimentos, a ordem para a liberação dos produtos era dada pela diretora executiva da FUVS na época, Silvia Regina Pereira da Silva, que se afastou do cargo para assumir a Secretária Municipal de Saúde, indicada pelo prefeito Rafael Simões.

Segundo os depoimentos, os materiais e os medicamentos eram levados em caixas para o setor de compras do hospital e retirados pelo próprio Rafael Simões ou pessoas da família dele.

Duas funcionárias também contaram à comissão de sindicância que ouviram do próprio Simões que os antibióticos seriam utilizados em animais de sua fazenda.

Valores abaixo do valor de compra

A própria sindicância traz cópias de cheques em que Rafael Simões pagou por parte dos produtos retirados. Os pagamentos foram feitos até com um ano depois da abertura da conta paciente.

Porém, há casos que, segundo a investigação interna, o prefeito pagou um valor inferior ao que o hospital pagou pelo material.

O funcionário da tesouraria do HCSL falou no depoimento que recebeu ordem para alterar os preços dos produtos da tabela particular para a tabela do SUS. O funcionário também falou que o hospital não poderia vender os produtos solicitados.

A secretária municipal de Saúde, Sílvia Regina Pereira da Silva, então diretora executiva da FUVS que autorizava a liberação dos produtos, foi convocação pela comissão de sindicância, mas não compareceu para prestar esclarecimentos.

Segundo sindicância, valor que deveria ter sido pago, se fosse cobrado como feito com pacientes que realmente utilizam os produtos dentro do hospital. (Reprodução)

Conta paciente em nome de Rafael Simões para compra de medicamentos e materiais. (Foto: reprodução)

Cheque de Rafael Simões nominal à FUVS pagando o valor refente a conta de menor valor. (Foto: reprodução)

Exames em animais de Rafael Simões no laboratório do HCSL

O bioquímico Flávio Antônio de Melo, responsável pelo laboratório no período analisado na sindicância, confirmou que foram feitos exames em amostras de sangue de boi duas ou três vezes no laboratório da instituição para Rafael Simões.

Relatório da sindicância

Após colher os depoimentos, a comissão de sindicância encaminhou o relatório para a Direção Interina da FUVS detalhando que a apuração demonstrou que houve irregularidades nos atos ocorridos na instituição. Apontou a responsabilidade de cada investigado para análise da assessoria jurídica e trabalhista da instituição. As medidas tomadas após isso foram noticiadas aqui no Terra do Mandu no dia 30 de agosto.

Os documentos da sindicância foram encaminhados para o Ministério Público Estadual e para o Ministério Público Federal.

O outro lado

Entramos em contato com a assessoria do prefeito Rafael Simões. Ele se manifestou por nota e nega que tenha cometido alguma irregularidade.

Nota:

POUSO ALEGRE, 14 DE SETEMBRO DE 2018

NÃO EXISTE NENHUM TIPO DE VEDAÇÃO LEGAL À RESPEITO DE COMPRAS DE MEDICAMENTOS E MATERIAS DO HOPITAL. O QUE ACONETECEU FOI UMA TRANSAÇÃO COMERCIAL SEM QUALQUER IRREGULARIDADE OU PREJUÍZO À INSTITUIÇÃO.

A SUPOSTA SINDICANCIA FOI INSTITUIDA PARA CRIAR UM FATO POLITICO EM ÉPOCA DE ELEIÇÕES. O QUE ME CAUSA GRANDE ESTRANHEZA É O FATO DO DIRETOR EXECUTIVO DA FUVS, SR. CORONEL FRANCO, ESTAR PREOCUPADO COM UMA RELAÇÃO COMERCIAL DE R$ 1.500,00, REPITO, SEM QUALQUER IRREGULARIDADE OU PREJUÍZO À INSTITUIÇÃO, E NÃO ESTAR COBRANDO DO GOVERNO PIMENTEL OS MAIS DE 35 MILHÕES QUE O ESTADO DEVE AO HOSPITAL.

RAFAEL SIMÕES.

Também procuramos a secretária de Saúde Silvia Regina Pereira dos Reis, através da assessoria de imprensa, porém, não recebemos retorno.


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